13 junho 2010

Heróis do nosso tempo

Alguém conhece este "entrapado" ??




Todos nós temos os nossos heróis, isso acontece logo em crianças com os rambos, os "Ches" e muitos outros. Normalmente há até os que entendem o próprio pai como seu herói principal.
Eu tenho alguns, já tive os que atras menciono e hoje tenho mais um, o meu amigo, melhor o meu Grande Amigo Moreira, ex-1ºcabo radiotelegrafista da 2415.
A nossa amizade iniciou-se quando alguém, megalómano, se lembrou de juntar uma centena de rapazes ingénuos na parada de C7 na Ajuda e nos obrigou a entrar no porão do barco mais à mão na Rocha Conde de Óbidos e rumar a Moçambique. 
Foi uma amizade fácil, crescendo dia a dia, pois logo sentimos que iriamos precisar um do outro, tanto nos bons como nos maus momentos. Eramos o que se pode dizer em Transmissões "uma grande equipa de dois", de modo algum querendo menosprezar os restantes elementos que muito estimo.
Impôs-se naturalmente desde o 1º dia na Ajuda, durante a viagem, passando por Lione, Luatize até ao fatidico momento do rebentamento duma mina no "unimog" onde ele seguia.
Nessa altura estavamos sediados em Tenente Valadim recém-chegados de Luatize (acho eu), à espera de fazer rumo para outras paragens. 
Num desses dias, mais precisamente a 30.10.69, o nosso amigo Meira mandou preparar um pelotão para fazer uma picagem até Luatize onde iriam entregar mantimentos ao pessoal lá aquartelado. E, como nada destas coisas têm explicação, lembrou-se de levar como radiotelegrafista o Moreira, coisa rara de acontecer, uma vez que era chefe de equipa e normalmente nunca saiam para o mato (se eu estivesse no lugar do Meira se calhar também queria comigo os melhores!).
E a desgraça aconteceu, o Peniche e o Corado (aqui habitualmente homenageados) nos deixaram para sempre, bem como um enfermeiro do CCS do Batalhão, havendo alguns feridos graves, entre eles o Moreira que diz lembrar-se de ter sido "cuspido" até ao alto das árvores e depois cair e ficar preso debaixo do "unimog", enquanto o radiador lhe despejava em cima toda a água fervente, sem se poder libertar, deixando-o com queimaduras  terriveis de ultimo grau, desde o peito até às pernas.
O resto todos sabemos como era: Despachado para o Hospital de Nampula que o recambiou de imediato para o de Lourenço Marques onde o prepararam e alindaram para o 1º Boeing o levar até à Estrela.
Esteve lá durante muitos meses, onde lhe chegaram a prever a morte.
Lembro-me de ter lá mandado os meus pais e irmã visitá-lo, porque ele sendo do Porto não tinha ninguém à mão para uma eventual ajuda. Assim o fizeram, mas logo recebi noticias pedindo que os desobrigasse daquela missão, pois era muito penoso e dificil olhar e falar com o Moreira com os seus 39 kg de peso. (Actualmente quando falamos nisso, ri-se tranquilamente, como se nada tivesse acontecido. Julgo que é preciso ser-se grande de espirito para assim entender).
Acontece até que com todas aquelas mazelas que lhe marcam o corpo, se necessário, "despudoradamente", exibe-as como um "troféu" de guerra!  É o cumulo da ironia!
Desde há 1 ano, por nos tornarmos vizinhos, encontramo-nos mais assiduamente. Garanto-vos que tem sido um enorme privilégio conviver com ele, tem-me ensinado a ver e a entender certas coisas da vida por outros prismas que até agora não me ocorriam. Acima de tudo porque tem um sentido humanista inigualável, raro hoje em dia, depois porque cultiva a solidariedade duma forma simples sem cobranças.
Felizmente que voltei a reencontrar o Moreira, assim se provando que aquela guerra estupida também deu os seus bons frutos
Obrigado  Padrinho!! 












1 comentário:

  1. Após vários dias de "jejum", sem vir ao nosso BLOG, encontro este magnífico POST do amigo Castro! Que magnífica crónica! Bem merece o Moreira esta homenagem, à qual me associo "de alma e coração"!
    A foto junto ao "monumento" deve estar a fazer 41 anos. Já estava pintada a inscrição LIONE E CHALA, mas ainda faltavam os versos de Camões, "Em perigos e guerras esforçados / mais do que permitia a força humana". (Houve quem desaconselhasse a colocação desta citação, vendo nela uma crítica subliminar ao comando do Batalhão do Catur... )
    Já agora, perdoem-me a imodéstia de assumir a autoria do projecto... mas quem o concretizou, no cimento, (e com que perfeição!!! ) foram o Moreira e o Castro !

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